Crônica dedicada a Inácio de Loyola Brandão e as 16 modelos da exposição "Retrato delas com suas fotos."
Aconteceu numa tarde de sábado. Quem poderia imaginar? Afinal, aquela tarde bem que parecia ser mais uma das tediosas tardes do falso outono paulista – pois a vida parecia estar, como sempre, parada sobre o leito das expectativas traçadas pela corrente do costume. O rio lambia as beiras das ruas que beiram o rio. Pescadores lançavam iscas de sonhos entre peixes e pedras. E o interminável etc do cotidiano insistia descaradamente em disfarça-se de espírito interiorano. Então, no meio daquela tarde telúrica e universal, abriu-se inesperadamente um enorme e maravilhoso vácuo. Um abscesso. Uma pausa – provocada pelo aparecimento súbito de um imenso retrato.
O fato é que esse retrato não era um retrato qualquer. Era um retrato vivo! Uma imagem impressionante na qual podia-se ver mexer um altivo homem – cuja aparência mentia os seus contados 72 anos. De imediato, as pessoas da cidade ficaram encantadas com o retrato desse homem – e, logicamente, com o homem desse retrato. Que atração ambos exerciam! Além disso, e por mais incrível que possa parecer, o homem do retrato também falava muito bem! Para o espanto de todos, o homem do retrato falava até pelos cotovelos – e era capaz de inventar as mais mirabolantes estórias em poucos segundos. E como ele sabia inventá-las!
Foi assim que, entre uma estória e outra, o homem do retrato (assombrando ainda mais a todos) acabou sendo cercado por outros retratos ainda mais belos do que ele, pois eram retratos de mulheres em fotográficas poses sensuais. Alguém na plateia fez a conta: “dezesseis novos retratos,” disse uma voz perdida. “Dezesseis retratos de mulheres nuas!” – exclamou uma outra voz. “Se elas puserem-se também a falar, aí é que estaremos todos perdidos” – disse uma voz preconceituosa. Mas as mulheres dos retratos não disseram nada. Elas apenas eram. Apenas estavam. E eram tanto e estavam tanto que a beleza delas chegou mesmo a calar a voz do homem do retrato – que não se fez de rogado e, sacando caneta e papel, pôs-se a escrever uma crônica sobre elas. Logo se deu então uma verdadeira exposição de vivas obras de arte: o retrato de um escritor em ação e as fotografias de suas musas nuas.
Em cada canto daquele mundo recém-nascido, uma estória e um retrato de mulher enchiam de beleza os olhos e os ouvidos dos que por ali se encontravam. Dezesseis mulheres nuas! – e o fim de ciclo da pureza em carnação fechava-se naquela composição inesperada. Não eram mesmo moças as deusas dos retratos? Talvez, não... (houve quem dissesse terem elas mais de 65 anos! Imaginem...). Mas que eram deusas, disso ninguém duvidava – pois cada uma exibia, impressas em seus corpos nus, bruxuleantes imagens de locais sagrados nunca antes vistos.
E o acontecido virou lenda. Uns dizem que o homem do retrato era um santo (em manifestação). Outros, que ele apenas tinha nome de santo: Ignácio de Loyola (Brandão?). As musas seriam as semideusas Ana Paes, Cecília Rodrigues, Dina Otaviano, Diva Mendes, Julia Baranowsly, Laurieta Galvina Gomes, Lucily Campos Trabanco, Mafalda Dato, Maria Aparecida Costa Manso, Maria do Carmo Ferreira, Maria Eliete Alencar, Maria Lemes Martins, Mayumi Oyamada, Railde Barbosa Lima, Vera Archanjo Oliva e Waldenice Nigro – fotografadas por Tika Tiritilli e Mônica Sucupira. A cidade em que tudo aconteceu, dizem que foi Piracicaba – e o palco dessa aparição, o teatro do SESC. O dia, 4 de abril de 2009. O tempo, o de hoje – mas bem que poderia ter sido o do infinito.
(Alexandre Bragion. Piracicaba, abril de 2009).
Caro Alexandre, tudo bem?
ResponderExcluirSumiu da aula da Julie?
Bom, vendo o texto acima, que acha do filme Palavra (En)Cantada?
link:
http://www.interfilmes.com/filme_19897_Palavra.en.cantada-%28Palavra.en.cantada%29.html
Abraço!